Rabiscos - XXI
"Estava sentada na mesa grande a olhar para o vazio das janelas que deixam entrar tanta luz!
Fez um ano desde que se sentou, pela primeira vez, naquela cadeira estofada de azul. As paredes forradas de azulejos, o tecto imponente com o seu brasão de onde pende um candelabro pesado. Continava impressionada pelo aconchego e imponência desta sala, como da primeira vez. E, tal como da primeira vez, já todo o movimento atarefado do dia a dia lhe deixava saudades.
Um ano passou e muitas coisas mudaram. Especialmente a sua capacidade de viver. As recordações, de há um ano, pareciam agora mais vivas e deixavam um vazio que teimou em não se preencher, com o passar dos meses. Apercebeu-se que há coisas que demoram a ser ultrapassadas. Pensou porque se cruzavam os seus caminhos, tão subtilmente, num sussurro suave e esporádico que fazia esquecer a mágoa, a raiva, as lágrimas.
Fechou os livros, arrumou as suas coisas e despediu-se daquele lugar. Despediu-se de tudo o que aquele lugar já lhe trouxera.
Tornou a fechar a porta, a trancar os sentimentos, a esquecer. Despediu-se, novamente, de uma vida que já não lhe pertencia há muito."
(Este texto está em Desacordo Ortográfico)